terça-feira, 4 de agosto de 2009

VOCÊ PODE REVISAR OS JUROS DO SEU FINANCIAMENTO

FONTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO RS
postado por Vanessa Baggio - Advogada

Ação Revisional e Consignatória - Contrato de Financiamento Imobiliárioa - Taxa de Juros

Apelação Cível n.º 70009033937 - TJ/RS



APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL E CONSIGNATÓRIA. CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO REGIDO PELO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO – SFH.

1. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Não procede a alegação de incompetência da Justiça Estadual, uma vez que a própria Caixa Econômica manifestou o seu desinteresse no presente feito, porque não figurou como agente fiduciário. Preliminar afastada.
2. INSTRUMENTO PARTICULAR DE COMPRA E VENDA E DE MÚTUO COM PACTO ADJETO DE HIPOTECA E OUTRAS AVENÇAS. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL AO CONTRATO REGIDO PELO SFH. A espécie contratual encontra-se regida pela Lei 4.380/64 com as alterações conferidas pela Lei 5.049/66, combinada com as disposições do DL 70/66, bem como o DL 2.164/64.
3. PRETENSÃO REVISIONAL. INTERVENÇÃO CORRETIVA COMO GARANTIA DA TUTELA DA CONFIANÇA E DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DO CONTRATO. Em face da concepção dos valores constitucionais da cidadania e da dignidade da pessoa humana (CF/88, art. 1º, incisos II e III), possibilita-se aos tribunais sólidas bases de referência para uma normativa intervencionista, notadamente, quando violadas as regras contratuais, ou em via de serem violados ditos princípios.
4. TAXA DE JUROS NOMINAL E EFETIVA. REFLEXOS NA AMORTIZAÇÃO DA DÍVIDA CALCULADA PELO REGIME DA TABELA PRICE. Estipulação contratual expressa sobre taxas de juros nominal e efetiva, bem assim o regime de amortização constante pela Tabela Price. Adoção de metodologia de cálculo de juros compostos e capitalizados, de forma mensal, acarretando a técnica financeira exponencial e geométrica (não linear) de cobrança de juros remuneratórios, sem a devida correspondência na amortização do saldo devedor frente às prestações pagas pelo mutuário. Ilogicidade do emprego deste método no âmbito do SFH. Limitação dos juros remuneratórios em 12% ao ano.
5 – CAPITALIZAÇÃO DE JUROS EMBUTIDOS NA TABELA PRICE – EFEITO EXPONENCIAL OU JUROS SOBRE JUROS. DESCABIMENTO. Na espécie contratual há incidência da capitalização composta de juros como sendo aquela em que a taxa incide sobre o capital inicial acrescido dos juros acumulados até o período anterior. Nesse regime de capitalização a taxa de juros varia de forma exponencial em função do tempo. Infringência às regras que regem os contratos regidos pelo SFH. Descabimento.
6. APLICABILIDADE DA TABELA PRICE NOS CONTRATOS DO SFH. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA. IMPOSSIBILIDADE. A legislação que rege o sistema financeiro da habitação não prevê a possibilidade de incidir a capitalização exponencial, ou seja, juros sobre juros, nas prestações devidas pelo mutuário, bem assim refletidas no saldo devedor, consoante os termos da Lei 4.380, de 21.8.1964, Lei 8.004, de 14 de março de 1984, e o DL 2.164, de 19.9.1984, os quais se aplicam ao caso concreto. Na hipótese da Tabela Price, por definição, os juros são compostos (exponenciais ou juros sobre juros) evidenciando-se a ilegalidade de sua adoção nos contratos imobiliários regidos pelo SFH.
7. A TUTELA DA CONFIANÇA E A BOA-FÉ OBJETIVA COMO GARANTIA DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL – DEVER DE LEALDADE, DE INFORMAÇÃO PRÉVIA E ADEQUADA SOBRE O REGIME DE CAPITALIZAÇÃO COMPOSTA (JUROS EXPONENCIAIS OU JUROS SOBRE JUROS) DA TABELA PRICE. A transparência das condições contratuais, notadamente aquela que se refere à formação e execução do contrato, implica o dever anexo à boa-fé como norma de conduta, de relevante destaque para a configuração da força vinculante do pacto regido pelo SFH. Sendo assim, seja pelo prisma da ilegalidade da capitalização composta de juros, ou pela total ausência de informação prévia e adequada sobre o método de amortização constante pelo uso da Tabela Price configura-se nula de pleno direito a sua adoção e aplicabilidade ao contrato regido pelo SFH, porém sem invalidar-se o contrato. Inteligência do § 2º do art. 51 do CDC.
8. CORREÇÃO MONETÁRIA. MARÇO DE 1990. BTNF. DEMAIS PERÍODOS. ÍNDICES DE CORREÇÃO DOS DEPÓSITOS DA CADERNETA DE POUPANÇA E TR. A partir da noção de que se afigura nos autos uma relação de consumo, esta Corte firmou entendimento de que, nos contratos de sistema financeiro, a correção monetária, em março de 1990, deve ser feita com base na variação do BTNF, no percentual de 41,28% e não o IPC de 84,32%. Diante da possibilidade de utilização dos dois índices para o reajuste das cadernetas de poupança, na época, deve ser utilizado o percentual menos oneroso ao mutuário, no caso, o BTNF, até porque foi o índice utilizado para corrigir a maioria dos depósitos de caderneta de poupança. Já, no que tange aos demais períodos, inexiste ilegalidade na adoção da TR para a atualização do contrato regido pelas normas do SFH. Precedentes jurisprudenciais. Exclusão do percentual de juros de 0,5% ao mês. Entretanto, tendo sido o contrato firmado em 10.07.1989, quando ainda não havia sido instituída oficialmente a TR, pela Lei nº 8.177/91, no período anterior à vigência dessa lei, deverão ser aplicados os índices previstos para correção dos depósitos da caderneta de poupança, excetuando-se o mês de março de 1990, em que deverá ser aplicado o BTNF, e incidindo, após março de 1991, a variação da TR, sem a incidência de juros no percentual de 0,5%. Apelo dos autores parcialmente provido, no ponto.
9. MOMENTO DO ABATIMENTO DA PRESTAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. ADEQUAÇÃO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DO CONTRATO. Admitir-se o abatimento da dívida, não atualizada, através da prestação já corrigida naquele mês, ocasionaria desequilíbrio contratual e o enriquecimento indevido dos autores. Pleito improcedente.
10. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA E IMPOSSIBILIDADE DE INSCRIÇÃO EM ÓRGÃOS DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO. Tanto a ação revisional, como a de cobrança de encargos abusivos e indevidos, descaracterizam a mora, o que retira o suporte jurídico para a inscrição dos devedores nos chamados órgãos de proteção ao crédito.
11. REPETIÇÃO SIMPLES DAS PARCELAS PAGAS A MAIOR. DEVOLUÇÃO. POSSIBILIDADE. A transparência e harmonia das relações de consumo (art. 4º da lei nº 8.078/90), resulta na possibilidade de repetição simples dos valores pagos a maior, por conta da exigência descabida das parcelas do mútuo. A devolução e compensação dos valores pagos pelo mutuário é corolário lógico do princípio do enriquecimento sem causa do credor. Precedentes jurisprudenciais.
12. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE. Nenhum óbice, nos termos do entendimento firmado por esta colenda Câmara, à possibilidade de compensação de honorários advocatícios. Precedentes do STJ.
APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS.

Data da decisão: 26-10-2005
fonte : http://www.mp.rs.gov.br/consumidor/jurisprudencia/id3170.htm